No climatério, as questões relacionadas à sexualidade têm se revestido de crescente valorização em virtude do aumento da crescente longevidade feminina nas últimas décadas e da maior prevalência de disfunções sexuais. 1
Os primeiros sinais e sintomas que sugerem que a mulher se encaminha para a menopausa coincidem com a regressão da função ovariana (entre os 35 e 45 anos de idade), podendo se estender por mais de uma década. 2,3
A sexualidade humana sofre a influência de fatores biológicos e psicológicos. Entre as inúmeras influências biológicas, a função endócrina é uma delas. Os hormônios exercem enorme papel sobre a sexualidade feminina. 4
No climatério acontecem transições hormonais que interferem diretamente na resposta sexual das mulheres. No ovário, o folículo pré-antral é responsável por sintetizar androgênios (androstenediona e testosterona) a partir do colesterol. Cerca de 50% da androstenediona e 25% da testosterona circulantes são derivados dos ovários, sendo os restantes sintetizados pela suprarrenal. Sabe-se que os androgênios têm um papel positivo na resposta sexual feminina, principalmente no desejo sexual. Na perimenopausa ocorrem perdas dos folículos ovarianos progressivamente, atingindo o esgotamento folicular e diminuindo a síntese dos hormônios androgênios ovarianos. 4
A queda dos níveis de estrogênio resulta na diminuição do suporte pélvico e da lubrificação dos tecidos urogenitais, causando dispareunia (dor durante a relação) e dificultando a atividade sexual. O hipoestrogenismo promove também a redução do colágeno cutâneo e alterações na distribuição de gordura corporal, causando mudanças na configuração corporal, o que, por sua vez, afetaria a autoimagem feminina, favorecendo uma menor autoestima e a redução do desejo sexual. 1
Outros sintomas físicos típicos desse período são aqueles que resultam das mudanças urogenitais. Alterações nas estruturas que apoiam a bexiga, assim como menor eficiência do mecanismo de fechamento da uretra, podem provocar algum grau de incontinência urinária. 5
Além disso, baixos níveis de estrogênio provocam atrofia da mucosa dos genitais, caracterizada por fragilidade do tecido epitelial da vagina e diminuição no fluxo sanguíneo e na secreção vaginal. Essas condições diminuem a capacidade de lubrificação da vagina, frente à estimulação sexual, podendo causar dispareunia, o que prejudica o funcionamento sexual e repercute negativamente sobre o estado psicológico da mulher. Este prognóstico é menos observado em mulheres com vida sexual ativa e regular. 6, 7
Na perimenopausa e no climatério ocorre um aumento significativo das queixas sexuais relacionadas sendo frequente queixas de menor desejo sexual, disfunções do orgasmo e dispareunia. O envelhecimento cursa com alterações dos níveis hormonais, ação ineficiente dos neurotransmissores e neuropeptídios, e redução tecidual dos fatores de crescimento e de outras substâncias envolvidas na função biológica. Os avanços da idade e as mudanças nos níveis hormonais no climatério podem ter repercussões biológicas e psíquicas negativas que são desfavoráveis aos sistemas envolvidos na resposta sexual normal. A percepção do envelhecimento, o nível cultural, o grau de satisfação emocional com o parceiro e a lubrificação vaginal inadequada influenciam significativamente o desejo sexual e o orgasmo. 1
Em 2008 foi realizado um estudo nos Estados Unidos com mulheres entre 30 e 70 anos, cujo objetivo era estimar a prevalência do desejo sexual hipoativo. Neste estudo foram consideradas apenas mulheres com relações estáveis a pelo menos 3 meses. Na conclusão do estudo percebeu-se que a prevalência de DSH nas mulheres entrevistadas na pré-menopausa era de 26,7% enquanto que esta prevalência quase que dobrou quando se analisou as mulheres na menopausa naturalmente, sendo detectados em 52,4% das mulheres do grupo. Ou seja, é inegável que a produção dos hormônios diminuída ou interrompida influencia no desempenho sexual e no desejo destas mulheres. 8
Ainda que haja um grande aumento de queixas de disfunções sexuais após a menopausa, também há a situação contrária, mulheres com atividade e satisfação sexual preservadas. Todavia, para que isso aconteça, essas mulheres necessitam estar saudáveis, com um parceiro estável e desfrutando de afeto no relacionamento. 9
Além de todas essas mudanças biológicas, as mudanças psicossociais e culturais associadas ao climatério podem alterar toda a dinâmica vivencial da mulher/casal. 10
O “luto” pela perda do corpo jovem, que tem de acontecer, propicia uma reelaboração positiva da autoimagem corporal em mudança. A “síndrome do ninho vazio” (saída dos filhos de casa) é vivida psicologicamente como uma perda que requer grande quantidade de energia para minimizar a dor. A “síndrome da viuvez”, que pode mais ocorrer com o evoluir da idade, pode levar a longos períodos de abstinência sexual com as dificuldades na retomada da sua vida em parceria.10
Além disso, inúmeros mitos assombram a prática sexual dessa faixa etária, sendo o maior deles, sem dúvida, o da “velhice assexuada”. Climatério é transição entre a fase adulta e senilidade e o sexo tem seu término apenas com a morte da pessoa e não com o envelhecimento. Se existe perda em quantidade, pode-se ganhar em qualidade através da experiência de vida. 10
Link para evento no YouTube: https://youtu.be/PeNzQ2XbDFw
Associação Brasileiras de Estudos em Medicina e Saúde Sexual – ABEMSS, Departamento de Disfunção Sexual Feminina, Comitê de Difusão e Web e Comitê científico.
Marina Beduschi Santos
Médica Formada pela Universidade do Extremo Sul Catarinense. Residência médica em Ginecologia e Obstetrícia no Hospital Universitário Evangélico de Curitiba. Especialização em Sexualidade Humana pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (USP). Título de área de atuação em Sexologia pela FEBRASGO. Membro da Sociedade Brasileira de Estudos em Sexualidade Humana (SBRASH), World Association of Sexual Health (WAS), Sociedade Latino Americana de Medicina Sexual (SLAMS), da Sociedade Internacional de Medicina Sexual (ISSM) e da Associação Brasileira de Estudos em Medicina e Saúde Sexual (ABEMSS).